quinta-feira, julho 29, 2004

Gentes da cidade

Metro.
Que merda de gente. É só coxos, cegos, anormais e velhos suados, desdentados e loucos. Ainda por cima cheiram mal. Os velhos e os outros.
Tenho de andar de metro todos os dias e depois apanhar o eléctrico, onde a coisa melhora um pouco. Já se vê outras pessoas e pelo menos o ar é mais saudável, se calhar por causa do ar condicionado que, nos eléctricos novos, está sempre ligado.
Mas mau, mau é apanhar o metro até ao centro comercial e ter de ir ao C&A – parece-me que as mesmas pessoas mal cheirosas, que vêm nesse percurso, me seguem até essa loja; e é vê-los todos suados a ir para os “provadores” experimentar as roupas mais berrantes e patéticas. Digamos que é uma verdadeira loja dos horrores.
Foda-se eu também suo, mas pelo menos tomo banho todos os dias, troco de roupa interior e meias todos os dias, e t-shirt, por vezes duas por dia. Só as calças é que as uso, e só de vez em quando, muitos dias seguidos… Tenho a sensação de que as pessoas fazem de propósito, aqui neste país à beira-mar plantado. Como sabem que vão andar de metro no dia seguinte e que cheira mal, não se lavam! Para quê gastar água e sabonete? E será que um desodorizante custa assim tanto?
Que merda de gente, que merda de cidade; mas não há nada a fazer: eu AMO-A, esta Lisboa suja, porca e badalhoca, com os seus metros e autocarros malcheirosos, os seus arrumadores que me apetece pontapear na cabeça, os seus barulhos, as suas colinas e miradouros; apaixonei-me por ela e jamais a poderei tirar da minha alma, entranhada que está na minha pele.
Ah, Alfama, o elevador da Glória e o da Bica, o Bairro Alto dos bares “cool” e restaurantes caros e das tascas com donos de unhacas no mindinho, grandes e sujas; que servem para tirar a cera do ouvido; e de bigodaça; as putas que passam na minha rua mal conseguindo andar em direcção ao Têcnico e eu fumando um cigarro na minha varanda, em boxers, e a sentir o calor do verão Lisboeta fazendo-me suar e ficar pegajoso…
Que cheires mal durante muitos anos Lisboa querida, que tenhas os teus velhoes e loucos desdentados, a merda de cão nos passeios e as gentes do metro que não tomam banho.
Eu cá estarei enquanto tu assim te mantiveres fiel a ti mesma.

quarta-feira, julho 21, 2004

Sento-me, cago e penso

Levantei-me tarde e após ter bebido um iogurte líquido de morango fui para a casa de banho, sentei-me e pus-me a “obrar”. “Obrar” é um termo que eu gosto particularmente pois é verdadeiramente ridículo; será que quem aplicou este termo ao acto de “cagar” considera que cada vez que se senta e “caga” está a executar uma obra? E será uma obra-prima? Bem, adiante…
Ali estava eu sentado indeciso entre começar a ler o Boris ou o Joyce quando de repente a força do pensar me assaltou; recordando neste caso a minha amiga Carla.
Conhecemo-nos numa festa e simpatizámos um com o outro, ela andava um pouco indecisa acerca dum mongo com quem mandava umas quecas e eu andava um pouco desiludido com o sexo oposto, no geral.
Desenvolvemos a nossa ligação e fomos encontrando vários pontos em comum, mas sempre numa base de amizade… Yah, pois, amizade! É muito difícil manter só uma amizade quando uma mulher e um homem, ambos heterosexuais, e ainda por cima com muitas afinidades, se começam a ver dias e dias seguidos…
É claro que passado pouco tempo já o desejo tomava conta das nossas conversas e acabou por acontecer o inevitável. Ambos o desejávamos, e embora houvesse algumas reticências lá fomos para frente com aquilo… Para a frente e por trás que, diga-se já de passagem, era como ela gostava mais; juntando a isto umas tantas “palmadas” e tínhamos Carla a gritar, e pronta a entrar no sétimo céu.
É curioso, agora que penso nisso, embora tenham sido poucas vezes, umas três ou quatro, foram boas; pelo menos para mim, se calhar para ela nem por isso. O apêndice que todos os homens têm no meio das pernas nem sempre actua como queremos, por vezes quer “libertar-se” cedo demais e isso pode ser uma desilusão para a outra pessoa. Mas pelo menos acho que me esforcei, fazendo o périplo todo antes de passar à “prospecção” propriamente dita.
Por acaso tenho pena de não teram sido mais as vezes; depois de tantas conversas em que Carla me confessou tamanhas proezas, nem sequer se dignou a mamá-la um pouco, algo que segundo a própria, gostava muito de fazer.
Ficou uma amizade, e isso nos dias que correm é cada vez mais díficil. Posso mesmo dizer que é das poucas mulheres com quem tive algum tipo de envolvimento físico, que posso considerar amiga. Vemos-nos de vez em quando, tomamos um café e falamos sobre a vidinha.
O que um gajo se lembra quando vai cagar; o que vale é que não lhe deu para se entesar, porque é um bocado desconfortável estarmos a cagar com a tranca colada à barriga… Limpei o cú, puxei o autoclismo e fui tomar banho, afaguei um bocado o “palhacito” só para relembrá-lo do bem bom e fui beber um café e fumar um cigarrito. Sabe sempre bem depois de deambulações mentais.

terça-feira, julho 13, 2004

A menina do iPod

Hoje acordei sobressaltado com o telemóvel a tocar; despachei-me rapidamente e saí para a rua para ir mandar um FAX. Estarão a pensar: “Mas por que raio é que o caramelo não cagou em casa?” – a verdade é que este não era um “fax” para o Mário Soares, mas sim um daqueles de papel mesmo, que se manda via faxmachine ("Ahh!" estarão vocês agora a dizer).
Dirigi-me então a uma estação de correios para o efeito (em particular à que fica dentro do Forum Picoas ali ao Saldanha), mal sabendo eu que mandar faxes custa os olhos da cara (bem antes esses do que o “outro”!).

Assim que entrei nos Correios tive de tirar uma daquelas senhas e aguardar a minha vez; tinha 3 pessoas à minha frente, sendo que uma delas era uma menina loirinha linda, que estava a ouvir música no seu iPod. Para quem não sabe, um iPod é uma espécie de leitor de mp3 mas muito melhor porque é da Apple, e que pode levar até 10000 músicas dependendo da versão. Ora ali estava eu com a folha que queria enviar por fax, na mão, e aquela miúda giríssima logo ali ao lado; é o suficiente para um gajo ficar distraído, e nessas alturas tudo pode correr mal, como foi o caso.
Começou logo por eu ter de escrever para quem se destinava o fax no cabeçalho da folha; para isso tiro da mochila a única (espécie de) caneta que tinha comigo, nada mais nada menos que uma caneta de tinta da China que a “minha mãeziiiiinha coitadiiiinha” (sempre que lembro da palavra mãezinha apetece-me logo cantar um faduncho daqueles da Mouraria ou Alfama, que conta sempre muitas desgraças. Infelizmente ainda só tenho este primeiro verso,e por isso peço desculpa pela interrupção da história) – como estava escrevendo, que a minha mãezinha me ofereceu.
Meus amigos não sei se já tiveram alguma caneta destas mas digo-vos desde já que não é boa ideia terem-na voltada com o bico para baixo. Ainda não tinha tirado a tampa e já havia tinta da China a correr por todo o lado nas minhas mãos. Sem lenços de papel que me valessem, lá tive de rasgar uma folha de um caderno para, não só, limpar as mãos, como também para limpar a caneta. É claro que as mãos ficaram na mesma todas “cagadas” e a folha que eu ia enviar ficou com um borrão.

Por sorte ninguém reparou no meu azar (pelo menos penso eu); as pessoas à minha frente estavam a ser todas atendidas, inclusive a “loirinha”, e depois de mim não tinha entrado ninguém. Foi nesta altura que reparei que a minha “loirinha” (qual minha qual carapuça, mas apeteceu-me ser um bocado abusado agora) não era portuguesa, isto porque se expressava num inglês bastante fluído. Não tenho certeza se era britãnica ou não mas lá que falava maravilhosamente a língua de Shakespeare, lá isso falava.

Por fim fui atendido, a “loirinha” levantou-se e foi à sua vida, nem sequer olhando para mim, o que me custou particularmente, posso vos dizer. As peripécias continuaram pois já não bastava ter as mãos naquele estado, ainda tive de escrever numa folha de papel o meu nome, o do destinatário e o número de fax para onde eu queria enviar a folha. É óbvio que esta segunda folha também ficou toda “cagada”, mas o homem que me atendeu nem tugiu nem mugiu (habituado a malucos deve estar ele, então com as mãos sujas…); limitou-se a levantar, enviar o fax, dar-me a prova de recepção da faxmachine e no fim pedir-me 2,40 €!!! Por um fax!!!

Fiquei de tal maneira atarantado que demorei uma eternidade a tirar a carteira para pagar (também não a queria sujar,né?) e quando o homem se levantou para me ir buscar o troco, pensando eu que este não era um dos meus melhores dias e estando sentado todo curvado com o peso do mundo sobre os ombros (isto é que é exagerar), olho para o lado e a “loirinha” passa....... olha para mim....... e SORRI-ME!
Oh alegria, oh maravilha; até me endireitei logo na cadeira e quando estendo a mão (sem me preocupar com o facto de ela estar suja) para receber o troco até já tinha o “cenho arreganhado” de tal maneira que o homem quase se assustou.

Eu sei, eu sei que muito possivelmente a “loirinha” viu a minha saga com a caneta e ao ver-me depois naquele estado desolado decidiu lançar-me um sorriso para ver se surtia um efeito positivo.

Pois é mas eu prefiro pensar que na verdade a “minha loirinha” foi com a minha cara e que como não foi possível mais nada entre nós, ficou pelo menos aquele sorriso para a eternidade (e para além dela).
E agora se me dão licença vou ouvir os Doors, e cantar por cima do Jim a música “I Look At You”:

“I looked at you
You looked me
I smiled at you
You smiled at me,
La la la la….”

Perfumai-vos e até....

O sitio mais desolador

É capaz de não haver neste momento em Portugal, sítio, ao mesmo tempo, mais desolador e interessante do que o Centro de Emprego. E dentro do Centro de emprego existem situações particulares que elevam a fasquia dessa desilusão e interesse: estou a falar das Sessões de Informação!
Mas em primeiro lugar um panorama geral do Centro propriamente dito – à porta está um segurança que também é porteiro, telefonista e que está ainda encarregue de encaminhar as pessoas que ali chegam; quase todas elas desorientadas. Existe, neste primeiro piso, uma sala de espera que ao fundo tem duas “técnicas” que tentam esclarecer e resolver os problemas das pessoas que ali vão. É nesta sala de espera que se misturam todo o tipo de pessoas!
Desde miúdos saídos, fresquinhos, da faculdade, a punks anarquistas que resolveram tentar arranjar emprego, passando por velhos suados e desdentados que trabalharam a vida toda na quinta do “Patrão” até que este a vendeu a um construtor civil que vai transformar essa quinta num parque de estacionamento…
Aparecem pessoas que riem (poucas) e viúvas idosas sem ninguém, que choram. E ali ficam todos à espera, às vezes bastante tempo, até serem chamados. Ali ficam na esperança de uma solução que nos dias que correm tarda a chegar.
Nos pisos seguintes temos vários gabinetes, das pessoas que teoricamente se esforçam para arranjar emprego para os que ali vão. Digo teoricamente pois a maior parte do tempo passam-no a marcar entrevistas, remarcar entrevistas, dar seguimento a despachos, receber cartas dos desempregados endereçadas ao Director do Centro, e a marcar, remarcar e dar as tais Sessões de Informação.
Nestas Sessões o que fazem então: juntam-nos todos numa sala, numas mesas em forma de U; e depois é começar a debitar informação que na maioria das vezes não interessa para nada. As pessoas lá preenchem uns formulários, dizem umas tantas coisas e depois vão às suas vidas exactamente na mesma ou ainda mais baralhadas.
Umas semanas depois ainda há lugar a mais uma sessão, desta vez não de Informação, mas para serem feitos uns testes de maneira a aferirem as nossas potencialidades. Ora isto está tudo muito bem, exceptuando o facto de estes testes já terem mais de sei lá quantos anos, estando portanto totalmente desactualizados. Mas enfim, estamos a falar de Portugal.
Posteriormente existe ainda uma “última” entrevista para discutir os resultados dos testes anteriores e dar seguimento ao processo. Só que em si mesmo esses testes não servem para nada pois no máximo vão-nos arranjar um novo emprego a fazer exactamente o que fazíamos antes de ficarmos desempregados…
E é isto o nosso Centro de Emprego; vejam bem o meu caso, em que conseguriam arranjar-me um emprego passado UM ano e sabem a fazer o quê? Isso; exactamente a mesma coisa que fazia…Vá lá era numa empresa diferente!!