sexta-feira, novembro 25, 2005

Valium. Sono induzido.

Valium. Sono induzido. Sono sem sonhos. Sono falso e que demora apenas algumas horas. Tomo dois com uma cerveja e deito-me esperando, mais ansioso do que queria, pela chegada desse sono, de qualquer sono.
A pouco e pouco a minha cabeça vai-se afundando na almofada, sinto o adormecimento a chegar, como se fosse um afogar lento e sem dor, sem luta da minha parte. Estou quente debaixo dos lençóis, a memória apaga-se, todo o sofrimento desaparece; sei que durará apenas algumas horas, mas no momento exacto antes de adormecer sinto-me melhor, sinto-me invencível, capaz das maiores façanhas.
A máquina apaga, faz shutdown, só mais logo haverá um reboot para mais um dia cinzento e frio. Tédio, a face amarela espreita no espelho, com dois círculos negros debaixo dos olhos. Se eu fosse uma personagem dos romances do Brett Easton Ellis teria alguma droga para me despertar e para me pôr a caminho; coca, ou speed ou um qualquer outro químico; mas como eu sou apenas eu, e vivo nesta parte desta cidade velha, que para lá de putas e lojas do chineses pouco mais tem, tomo um café; um fraco substiuto para estimulante, e encaminho-me para o metro, que para além de outras coisas e outros cheiros; como mijo, tem a particularidade de me mostrar seres humanos que ainda estão pior do que eu; ou será que estão? – Ali à frente deitado num banco, um jovem, mas com o aspecto de ter 40 anos, com muletas ao lado, cheio de abcessos na cara e no corpo; sei que está vivo apenas porque o peito levanta e desce quase imperceptivelmente; do outro lado da linha um bêbado, prega o fim do mundo, e ao mesmo tempo afirma que o Partido Comunista é a única solução para este país; ao seu lado 3 ciganas esperam ansiosamente pelo próximo comboio, com sacos enormes cheios de material de contrafacção que esperam vir a vender em qualquer uma das saídas de metro.
Que belo acordar e que belo dia este vai ser, durante as próximas 8 horas estarei num sítio em que tentarei desempenhar uma função para a qual não estou minimamente interessado em desempenhar. A meio do dia as costas começarão a doer-me, tomarei um comprimido para as dores; a pausa para o almoço será curta demais e no final, voltarei pelo caminho contrário ao que fiz de manhã, e depararei com gente em cujas faces verei o meu próprio desalento reflectido.
Abre-se a porta da rua e entra-se em casa, larga-se o casaco e a mala em qualquer canto; abre-se o frigorífico bafiento e descobre-se que pouco há para comer; também não interesssa, bebe-se uma cerveja.
Lá fora parece que está a chover, digo parece pois o som que sai das colunas está tão alto que nem sequer consigo ouvir as vozes dentro da minha cabeça… Não, há algumas vozes que sempre oiço, sobrepõem-se a tudo, seja som, imagem, drogas ou pessoas… Ligo o computador e vejo os mails, faço uma compra na internet. Fútil, fútil, banal, tédio brutal… Graças à chuva tenho 4 canais de televisão, é uma coisa que não sei explicar, a minha antena, só funciona bem com o mau tempo; mas também podia não ter nenhum que o resultado era o mesmo. Imagens atrás de imagens, às quais sou indiferente, apenas informação que o meu cérebro não assimila, e neste caso ainda bem.
Está frio, por isso não faço a barba, farei amanhã ou noutro dia qualquer, apenas dispo a minha roupa, e ao fazê-lo o corpo dá de si, doem-me os músculos todos, incluindo o meu caralho que parece ter sido crucificado. Fumo mais um cigarro, talvez a inalação da nicotina provoque tonturas, náuseas e me faça vomitar, só naquela de expelir qualquer coisa, para me sentir mais humano.
Já é tarde, segundo me diz o relógio são horas de dormir, mas não tenho sono; não que tenha grande vontade de ficar acordado, para quê? Ainda tenho valiuns é o que vale…
Valium. Sono induzido. Sono falso mas é o que resta e por isso tomo dois com um gole de cerveja…