terça-feira, setembro 07, 2004

Cadelas com cio

Laura tinha andado enrolada com Zé durante uns bons dois anos. Hoje em dia parecia-lhe, a ele, que até tinha sido tempo demais. Zé conheceu-a numa altura em que ela namorava com um gajo de quem já não gostava, para além de este ter uma pissa enorme que a incomodava bastante quando fodiam.
Começaram por se olhar umas tantas vezes, Zé pensando que Laura não o gramava, e Laura achando Zé um bocado arrogante, mas até gostando dessa atitude nele. Por essa altura proporcionou-se um jantar a que ambos foram; beberam os dois que nem mulas e no desenrolar da noite começaram de conversar, ele doido por mandar uma e ela também doida só que mais recatada e a fazer o papel de namorada fiel. A partir dessa noite começaram a sair, mas sem haver sexo, só uns valentes amassos. Zé já andava maluco da vida, porque a miúda nunca mais se decidia, nem a acabar com o namorado, nem a foder com ele.
Finalmente depois de um outro jantar em que Laura se emborrachou toda, e depois de passar a noite a mandar vir com Zé e a dizer que estava apaixonada por ele, lá fizeram amor, o melhor que o álcool lhes permitiu.
Zé serviu então de trampolim para Laura acabar com o anterior namorado e também, ao mesmo tempo, para ir descobrindo uma sexualidade que a própria Laura não sabia que tinha. No princípio tinha até alguns falsos pudores, não fazia broches nem nada, mas curiosamente adorava que Zé lhe lambesse o pito. Para Zé era incompreensível como é que uma mulher mais velha do que ele tivesse aquele comportamento, que se veio a comprovar mais tarde ser só fachada. Assim que começaram a falar mais sobre sexo e a fantasiar acordados, Laura começou a revelar-se.
Verdade seja dita, certas mulheres têm, latente ou não, um certo desejo de serem maltratadas, uma certa propensão para o masoquismo; Laura é uma dessas mulheres e Zé em certa medida despertava nela todos esses desejos recônditos.
Depois de mil e uma aventuras e outras tantas quecas, a última das quais na rua junto à porta do prédio de Laura, afastaram-se sem rancores e naturalmente. Embora tenha ficado um desejo sempre presente, que deu para umas tantas recaídas nomeadamente no carro de Laura, esse afastamento foi real até existir apenas uma espécie de amizade.

Para espanto de Zé um dia ao ligar a Laura, esta diz-lhe que estava à espera do namorado, ao que Zé lhe pergunta se era a sério a relação, se ela estava apaixonada. Respondeu-lhe que não sabia; ora se não sabe é porque não está, pensou Zé. Apesar disto lá continuou Laura com o “namoradinho” dela, Zé chegou mesmo a vê-la passados poucos dias com ele, juntamente com o pai e a irmã dele. E o gajo, um tal de Roberto, era um idiota de primeira, só pensava era no ginásio e em ganhar “caparro”, e mandar umas valentes quecas em Laura. Mas com os idiotas é sempre assim, o que não têm no cérebro sobra-lhes na pila.
Zé perdeu todo o respeito que tinha ainda por Laura, embora já fosse pouco também, porque depois de alguém nos fazer um broche numa casa de banho pública e querer que a sodomizemos num parque de estacionamento enquanto espetamos umas lambadas no cu, torna-se difícil haver grande respeito. Tesão sim, respeito é outra história.

Laura era apenas mais uma entre tantas que Zé já tinha encontrado por aí; por esta altura sentia-se cada vez mais cansado, não só no corpo que parecia cada vez mais decrépito aos seus olhos, mas principalmente na mente e no espírito. Cada vez mais lhe parecia que as mulheres tinham um e só um desejo: encontrarem uma bela pissa grande e grossa que lhes fizesse esquecer tudo o resto… Não passavam de umas cadelas com cio sem mais nada dentro da cabeça. Quanto aos homens onde ele se incluía, também não tinha grandes dúvidas: eram uns montes de merda sempre à procura de um buraco e de um “jogo da bola” na televisão, tudo isto regado com muita cerveja de preferência.
Zé desespera e começa a encarar o suícidio como a única via possível para deixar este mundo cheio de sujidade, falsas aparências e mentira; em que os homens são uns punheteiros e as mulheres são umas cabras.
Dentro das possibilidades escolhe os comprimidos como solução, já que tinha um amigo farmacêutico que lhe arranjava uns por fora sem perguntas.

Sexta-feira 23 de Março, um dia estranhamente quente e luminoso para aquela altura do ano, Zé abre as janelas, põe o único single em vinil que possuía: “This Is Not a Love Song” dos PIL; enche um copo com água e deixa-se ir sem esforço… A única coisa que os pais encontraram passado uma semana, para além do cheiro nauseabundo, foi um papel ao lado do seu corpo com o seguinte:

“As vossas almas e mentes caem no vazio,
Ninguém tem coragem para fazer a revolução;
Existem como montes de merda que fluem como um rio,
Vermelho e sujo como uma menstruação
De umas cadelas com cio”